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Direto ao Ponto – Edição 2022/001

A PROTEÇÃO AO MENOR É DEVER DE TODOS: STJ RESPONSABILIZA FACEBOOK POR OMISSÃO AO SE NEGAR A EXCLUIR FOTO DE MENOR DIVULGADA SEM AUTORIZAÇÃO.

A Quarta Turma do STJ negou provimento a recurso especial do Facebook, apresentado com intuito de reformar sua condenação por ter se negado a excluir publicação em que um menor de idade aparecia em foto, juntamente com o pai, contendo mensagem que acusava este último de envolvimento com os crimes de pedofilia e estupro.
Quis o Facebook se valer de dispositivo do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), para sustentar que somente poderia ser responsabilizado por danos provocados por terceiros (usuários da rede), se efetivamente deixasse de cumprir ordem judicial para tornar o conteúdo indisponível.
A Corte Superior, entretanto, destacou o caráter especialíssimo do Estatuto da Criança e Adolescente, prevalecendo como sistema de proteção ao menor, sobrepondo-se ao regramento legal que rege o serviço de informação prestado pelo Facebook. Enfatiza, ainda, que o texto constitucional é quem impõe a toda a sociedade o dever de zelar pela dignidade da criança e do adolescente (art. 227), o que, nesse caso, é retratado pelo dever de afastar qualquer tipo de tratamento vexatório ou constrangedor, independente da existência de ordem judicial.
Não deve o Marco Civil da Internet ser aplicado, portanto, de forma isolada, concluindo pela condenação do Facebook por omissão de conduta, uma vez que deixou de tomar as providências que estavam a seu alcance para minimizar os efeitos do ato danoso praticado por terceiros.

IMOBILIÁRIO: DESISTÊNCIA DE COMPRADOR MOTIVADA POR NÃO OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO POSSIBILITA APLICAÇÃO DE CLÁUSULA DE RETENÇÃO DE 50% DO VALOR PAGO.

A Quarta Vara Cível de Tatuapé/SP reconheceu a legitimidade e aplicação de cláusula de retenção de 50% da quantia paga em favor da incorporadora, em virtude de os compradores desistirem da aquisição do imóvel, motivados pela não obtenção de financiamento bancário.
A decisão tem como fundamento legal dispositivos da recente Lei do Distrato (Lei nº 13.786/2018), que tem como maiores destaques a definição de penalidade para os casos de atrasos de entrega das obras, o estabelecimento de parâmetros para o exercício do direito de arrependimento e a estipulação das diretrizes para a desistência de negócios.
A Lei nº 13.786/2018, sancionada no momento de crise do segmento da construção civil, tem o propósito de equacionar negócios imobiliários e impedir tanto que consumidores sejam lesados, quanto que as incorporadoras se vejam em declínio financeiro, funcionando como ferramenta do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos.
A retenção de 50% estabelecida contratualmente no caso destacado encontra amparo legal no artigo 67-A, que estabelece que a incorporadora poderá penalizar o comprador em até 50% da quantia paga, quando a incorporação estiver submetida ao regime do patrimônio de afetação, formato em que o valor pago pelos compradores é destinado à construção do próprio empreendimento.

A SIMPLES DEMORA NA BAIXA DE GRAVAME NÃO CONFIGURA DANO MORAL INDENIZÁVEL.

No Julgamento do Tema Repetitivo nº 1078, o STJ firmou a tese de que a demora para realização da baixa de gravame de alienação fiduciária, por parte de instituição financeira, por si só, não configura o dever de indenizar. Na origem da controvérsia, o Autor da ação pretendia ser indenizado, em virtude da não liberação de gravame registrado sobre automóvel financiado. Argumentou que a demora na exclusão do gravame após a quitação do contrato de financiamento, importaria em dano moral in re ipsa (aquele que é presumido e não demanda comprovação).
Rememorando conceitos básicos da responsabilidade civil e listando temas que o STJ tem assentados como capazes de configurar o dano moral presumido, o Ministro Marco Aurelio Belizze enfatiza o crescimento do número de demandas reparatórias fundadas em transtornos diários que alcançam qualquer cidadão e menciona a necessidade de comprovação de situação extraordinária capaz gerar efetiva lesão à dignidade, para que se enxergue que não se trata de simples aborrecimento.
Ao concluir o raciocínio da decisão, o Ministro reconhece o aborrecimento suportado pelo autor da ação, mas registra que “tal fato não passa de mero contratempo, comum à moderna vida em sociedade, não podendo simples transtorno ser definido como dano moral, sob pena de banalização do instituto.”

GARANTIA PARCIAL DE DÉBITO NÃO IMPEDE INSCRIÇÃO DO EXECUTADO NO CADASTRO DE INADIMPLENTES.

A efetividade de decisões judiciais e do procedimento da execução estão entre os temas priorizados pelo Código de Processo Civil de 2015, onde constam listadas medidas executivas típicas e expressa a possibilidade de o juiz empregar medidas atípicas para a satisfação da obrigação.
Entre as medidas típicas, há a faculdade do juiz em determinar a inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes, mediante pedido da parte credora. Essa medida funciona como instrumento de coerção indireta, exercendo uma espécie de pressão econômica sobre o devedor, forçando-o ao pagamento, vez que a negativação representa enorme limitador dentro do contexto da atual sociedade de consumo.
Sem descuidar-se do princípio da “menor onerosidade da execução”, ao julgar o REsp 1.953.667-SP, o STJ, sob a compreensão de que a menor onerosidade da execução não se sobrepõe à efetividade da execução, firma o entendimento de que se o débito for garantido apenas parcialmente, inexiste óbice à determinação judicial de inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes, mediante pedido da parte exequente, servindo essa medida como incentivo para a garantia integral do débito ou a realização do pagamento.

 

PROTEÇÃO DE DADOS: SANCIONADA LEI QUE GARANTE SIGILO A PESSOA QUE VIVE COM HIV, HBV, HCV, HANSENÍASE E TUBERCULOSE.

Em 04 de janeiro de 2022, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 14.289/22, que torna obrigatória a preservação do sigilo sobre a condição de pessoa que vive com HIV, hepatites crônicas (HBV e HCV) e de pessoa com hanseníase e com tuberculose.
A Lei deve ser especialmente observada por serviços de saúde, públicos e privados, bem como operadoras de planos de saúde e todos os profissionais da área, além de estabelecimentos de ensino e empregadores, sob pena das sanções previstas não só nessa lei recém aprovada, mas como também na LGPD.
A legislação visa garantir a inclusão e prevenir discriminações no acesso a empregos, educação, serviços e demais direitos. Cabe destacar que dados de saúde, de acordo com o art. 5º, II, da LGPD, \revelam dados sensíveis e, portanto, devem ser tratados com o grau adequado de cuidado, com a implementação de medidas de segurança técnicas e administrativas aptas a proteger esses dados de acessos não autorizados ou de qualquer forma de tratamento inadequado ou ilícito e demais medidas exigidas pela LGPD.

 

SENTENÇA TRABALHISTA RECONHECE VIOLAÇÃO À LGPD.

Em nome dos indivíduos que fazem parte do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação de Montenegro, foi movida ação coletiva em face da Cooperativa dos Citricultores Ecológicos do Vale do Cai Ltda, alegando o compartilhamento de dados com outros agentes de tratamento sem observar os devidos cuidados jurídicos de acordo com a LGPD e Marco Civil da Internet, com desatenção à intimidade, privacidade e imagem dos titulares.
O Tribunal do Trabalho da 4ª Região reconheceu violação à LGPD, destacando o tratamento indevido de dados com a ausência de requisitos previstos na legislação, como a transparência no tratamento de dados, a falta de um encarregado nomeado e de medidas comprobatórias de segurança e sigilo dos dados. Além disso, a magistrada que proferiu a decisão afastou os argumentos utilizados pela Cooperativa de que a função do encarregado ainda não estava regulamentada pela ANPD, e que o tratamento de dados dos colaboradores dependeria do consentimento de cada um deles.

TRIBUTÁRIO: ESTÁ EM VIGOR NOVO PARCELAMENTO FEDERAL (REFIS) PARA EMPRESAS NO SIMPLES NACIONAL.

Foi publicada no dia 11/01/22 a Portaria da PGFN/ME que institui o Programa de Regularidade Fiscal de débitos das pessoas jurídicas inseridas no SIMPLES Nacional.
Esperado por muitos, esse novo REFIS, no entanto, só abrange débitos que forem inscritos em dívida ativa da união até o dia 31 de janeiro de 2022.
A “exclusão” dos demais débitos é de fácil explicação: a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional só se torna responsável pelos débitos após a sua inscrição no CADIN, quando saem da via administrativa da Delegacia da Receita Federal e passam para o setor judicial da Fazenda, que é representada justamente pela PGFN.
Dentre os termos da Portaria, se estabelece que os referidos débitos poderão ser pagos em até 137 meses, com descontos de até 100% do valor dos juros, das multas e encargos-leais, mediante o pagamento de uma entrada equivalente a 1% do valor total negociado, a ser feito em até 08 parcelas. O valor de cada parcela, por sua vez, será o maior encontrado entre 1% da receita bruta mensal (o mês de referência será o anterior à adesão) ou o valor correspondente ao débito consolidado dividido pela quantidade de parcelas a qual optou o contribuinte, não podendo ser menor que Cem Reais (exceto para os Microempreendedores Individuais, que possuem piso no valor de R$ 25,00).
Apesar da adesão ao referido parcelamento poder ser feita diretamente por meio eletrônico (www.regularize.pgfn.gov.br), os termos do parcelamento serão analisados individualmente pela PGFN, considerando a classe dos débitos, situação econômica e capacidade de pagamento do contribuinte.
Por fim, casos já existam parcelamentos em andamento, bem como discussões judiciais ou administrativas sobre a exigibilidade dos débitos cobrados, estas precisarão ser renunciadas, para efetiva consolidação da nova negociação, o que – sem dúvida – requer uma atenção especial pelo contribuinte e sua assessoria jurídica e contábil.

DIFAL: JÁ COMEÇAM OS QUESTIONAMENTOS SOBRE A EXIGIBILIDADE DO DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA DE ICMS SOBRE VENDAS À CONSUMIDOR FINAL LOCALIZADOS FORA DO ESTADO DO VENDEDOR.

Mais uma vez o contribuinte corre o risco de ser onerado pela ineficácia do Legislativo.
Aprovada no último dia 04, a Lei Complementar nº 190/22 altera a Lei Kandir (LC 87/1996),  estabelecendo a obrigação de recolhimento do diferencial de alíquota de ICMS em operações interestaduais, mesmo quando se tratar de venda para consumidor final, obrigação não existente até então.
No entanto, as Secretarias da Fazenda dos Estados já pretendem exigir esse pagamento de imediato, não respeitando o princípio constitucional da anterioridade e suas variações, que exigem que um tributo só pode ser exigido no ano seguinte ao seu estabelecimento, ou pelo menos 90 dias após a publicação da Lei que o estabelece (princípios da anualidade e da noventena).
As Fazendas Estaduais tentam fundamentar sua cobrança alegando que não foi criado nenhum novo tributo, nem sequer majorada sua alíquota, no entanto, a alteração da base de cálculo para abranger uma operação não alcançada pelo DIFAL (Diferencial de alíquota) já envolveria um novo ônus tributário, e portanto, uma necessidade de se respeitar as mencionadas exigências constitucionais, o que daria ao contribuinte tempo para se planejar financeiramente para a nova – ou aumentada – obrigação tributária.
Já se sabe de – pelo menos – uma decisão judicial em São Paulo garantindo o direito do contribuinte em de não ser obrigado a recolher diferencial de alíquota de ICMS para vendas realizadas à consumidor final localizado fora do estado, mas – considerando toda a ofensa legal e aumento de custos tributário não previstos antecipadamente – muitas outras empresas deverão buscar seus direitos perante o Judiciário Estadual.
Os Estados estão reunidos em Comitê Nacional para unificarem as decisões sobre a data de inicio da cobrança. No entanto,  Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte, por exemplo, já se manifestaram que o início se daria em Abril de 2022, respectivamente em 1º, 5 e 1º  de Abril. Já Piauí e Bahia editaram Lei fixando o inicio da cobrança desde 1º de Janeiro do ano corrente.

TRABALHISTA: CONFIRMADA A INCONSTITUCIONALIDADE DA TR PARA CORREÇÃO MONETÁRIA DE DÉBITOS TRABALHISTAS.

O STF confirmou jurisprudência dominante no sentido da inconstitucionalidade da utilização da TR como índice de atualização dos débitos trabalhistas, tendo fixado que, até deliberação da questão pelo Poder Legislativo, devem ser aplicados o Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), na fase pré-judicial, e, a partir do ajuizamento da ação, a taxa Selic, excetuando-se as dívidas da Fazenda Pública, que têm regramento específico.
Destaca-se ainda que a incidência de juros moratórios com base na variação da taxa Selic não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem.
Demais disso, os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento, independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal, devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF.
Lado outro, os parâmetros fixados no julgamento aplicam-se aos processos, ainda que transitados em julgado, em que a sentença não tenha consignado manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros.
A matéria foi analisada sob a sistemática da repercussão geral, ou seja, será aplicada posteriormente pelas instâncias inferiores, em casos idênticos.
A decisão trará impacto considerável nos valores das ações judiciais em curso, de forma que se sugere que sejam feitos os devidos ajustes também nas provisões das condenações e revisão da estratégia de atuação no contencioso trabalhista.

ASSEGURADA POR LEI A PROTEÇÃO AOS ENTREGADORES DE EMPRESAS DE APLICATIVOS.

A Lei 14.297/2022 estabeleceu medidas de proteção ao entregador que presta serviço por intermédio de empresa de aplicativo de entrega, durante a vigência da emergência em saúde pública decorrente do coronavírus responsável pela covid-19.
A lei determina que a empresa contrate seguro contra acidentes para esses trabalhadores e garante assistência financeira para os mesmos, em caso de infecção pelo Covid-19 pelo período de 15 (quinze) dias, o qual pode ser prorrogado por 2 (dois) períodos de 15 (quinze) dias, calculada de acordo com a média dos 3 (três) últimos pagamentos mensais recebidos. Estabelece ainda que as empresas de aplicativo de entrega devem disponibilizar ao entregador máscaras e álcool em gel ou fazer o respectivo reembolso quando os referidos utensílios forem adquiridos pelo trabalhador. As empresas devem também alertar o trabalhador acerca dos riscos do coronavírus bem como acerca dos cuidados necessários para se prevenir o contágio e a disseminação da doença.
É preciso destacar ainda que a lei preceitua que do contrato ou do termo de registro celebrado entre a empresa de aplicativo de entrega e o entregador deverão constar expressamente as hipóteses de bloqueio, de suspensão ou de exclusão da conta do entregador da plataforma eletrônica. Restou estabelecido que a penalidade de exclusão deve ser precedida de comunicação prévia, com antecedência de 3 (três) dias úteis, acompanhada das razões da aplicação da penalidade.
O ponto chave da lei é o seu Art. 10, que indica que os benefícios e as conceituações previstos na norma não servirão de base para a caracterização da natureza jurídica da relação entre os entregadores e as empresas de aplicativo de entrega. O que se infere da leitura do referido dispositivo é que a concessão dessas medidas protetivas aos entregadores não resulta na certeza da existência de vínculo empregatício.
Vale frisar que existe muita controvérsia nos tribunais trabalhistas do país acerca da (in) existência de vínculo empregatício entre entregadores e empresas de aplicativo de entrega. O fato é que não se trata de uma situação homogênea e cada caso deve ser analisado à luz das suas particularidades, quando houver a judicialização de questões dessa natureza.

Por Aline Melo, Edson Gomes, Flávia Meireles, Luís Gadelha e Raul Aguiar.


MENOS RISCOS, MENOS BUROCRACIA E MAIS EFICIÊNCIA

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