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Direto ao Ponto – Edição 2022/004

TRABALHISTA: STF VALIDA ‘PEJOTIZAÇÃO’ ENTENDENDO QUE A PRÁTICA É UMA FORMA DE TERCEIRIZAÇÃO LÍCITA. A PERMISSÃO ENVOLVE A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE NATUREZA INTELECTUAL COM NÍVEL DE ESCOLARIDADE E SALÁRIOS EXPRESSIVOS.

‘Pejotização’ é nome que se dá à prática de se contratar pessoa jurídica constituída por trabalhador para prestar serviços a uma determinada empresa, ao invés de se contratar um trabalhador com vínculo de emprego.
A Justiça do Trabalho tradicionalmente presumia que a contratação de trabalhador através da sua própria pessoa jurídica configura fraude à legislação trabalhista, por entender que o contrato entre a pessoa jurídica do trabalhador e tomador de serviço estaria servindo apenas para mascarar uma relação de emprego factualmente existente, e que o trabalhador, na sua condição de hipossuficiente, estaria obrigado a aceitar tal imposição empresarial.
Embora a presunção da fraude prevalecesse, a jurisprudência trabalhista já apresentava divergências quanto a este tema, vez que ainda que minoritárias, determinadas correntes  defendiam que o julgador deve considerar a vontade das partes na escolha da relação jurídica que os vincula, e que a forma de contratação pode ser objeto de livre disposição de trabalhadores e tomadores dos serviços.
Ao que tudo indica, o STF começou a colocar um fim na divergência de entendimentos, quando no último dia 8 julgou a Reclamação n® 47.843. Em precedente paradigmático, a 1ª Turma do STF admitiu a legalidade da contratação de profissionais que exercem atividades intelectuais com nível de escolaridade e salário expressivos, mediante terceirização.
A aludida decisão tornou sem efeito o acórdão do TST que considerava ilegal a contratação de pessoas jurídicas formadas por médicos que prestavam serviços à hospitais públicos da Bahia.
No caso, médicos constituíram pessoas jurídicas para serem contratados por unidades públicas de saúde, e a Justiça do Trabalho considerou que a ‘pejotização’ era fraudulenta, uma vez que os médicos eram subordinados e prestavam pessoalmente seus serviços, o que, no entendimento da Justiça do Trabalho, caracterizava uma relação de emprego.
No entanto, o STF aponta que o primeiro passo para se dirimir a questão é verificar se o trabalhador é hipo ou hipersuficiente. Para o Tribunal, a hiper e hipossuficiência do trabalhador está relacionada à disposição de recursos financeiros deste: se o trabalhador não apresenta a característica de debilidade que justifica a limitação da autonomia da vontade, simplesmente não há razão de ser para a imposição da relação de emprego, principalmente quando tal modelo sequer traria vantagem para o próprio trabalhador, mesmo porque a mera subordinação estrutural ou indireta é inerente à própria terceirização.
O entendimento é um divisor de águas no mundo jurídico, validando modelo de contratação amparado pela reforma trabalhista e viabilizando negócios que nela se apoiaram.

ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO: CONTRATO DE CONSÓRCIO QUE INDUZ AO ERRO É ANULADO POR RECONHECIMENTO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, recentemente, anulou contratação de consórcio por compreender que o consumidor foi ludibriado pela Administradora, na medida em que essa o fez acreditar que estava adquirindo cota já contemplada para aquisição de um imóvel.
Ao pagar o valor de entrada e não receber sua carta de crédito, o consumidor notou que havia sido induzido ao erro, tendo ajuizado ação para requerer a rescisão contratual, imediata devolução e a respectiva indenização por danos morais.
O raciocínio jurídico que confirmou os pedidos reconhece que o sistema de consórcios é regulamentado pela Lei Federal nº 11.795/08 e que nela há expressão de que a contemplação se dá através de sorteio ou lance dentre o grupo de consórcio firmado, igualmente identificando que essa orientação consta no regulamento. Contudo, isso não afasta a possibilidade de que o Autor da ação tenha sido vítima de uma promessa de contemplação em prazo menor, usando da ingenuidade, falta de conhecimento técnico e do próprio regramento jurídico, situação que se evidenciou a partir das provas apresentadas no processo.
Dessa forma, a decisão confere proteção à parte lesada por um negócio jurídico em que se enxerga erro e dolo, como vícios e, mais ainda, escancara a importância de ser guardado o princípio da boa-fé contratual e os seus deveres anexos.

STJ DECIDE: VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA QUE PERMANECE RESIDINDO NO IMÓVEL DO CASAL NÃO TEM OBRIGAÇÃO DE PAGAR ALUGUEL EM FAVOR DO AGRESSOR.

A 3ª Turma do STJ, por unanimidade, reconheceu que a imposição de pagamento de aluguel por vítima de violência doméstica que permanece utilizando o imóvel, como forma de indenizar o cônjuge coproprietário do bem, tal como prevê o artigo 1319 do Código Civil, importa na afronta à dignidade da pessoa humana e igualdade, bem como viola objetivos fundamentais do Estado, como a promoção do bem de todos sem preconceito de gênero.
A decisão se justifica no raciocínio de que a exigência desse pagamento serviria de estímulo para que a vítima de violência doméstica deixasse de buscar proteção contra a violência praticada, prestando-se a revelar a desproporcionalidade econômica entre cônjuges.
A medida protetiva que se destina a afastar o agressor do lar se constitui como motivo legítimo de limitação do domínio dele sobre o imóvel, utilizado como moradia conjunta, não havendo, portanto, enriquecimento sem causa que justifique o arbitramento de indenização na forma do pagamento de aluguéis.
Dessa forma, descabe a pretensão indenizatória intentada pelo agressor, amparada na fruição exclusiva de coisa comum, prevista no artigo 1319 do Código Civil, seja pela observação de assistência à família constitucionalmente assegurada pelo Estado, até mesmo com a criação de mecanismos para coibir a violência, seja pela inexistência de enriquecimento sem causa.

PROFESSOR: INSTITUIÇÃO NÃO TERÁ DE INDENIZAR PROFESSORA POR USO DE VÍDEO AULAS APÓS RESCISÃO CONTRATUAL.

Em recente acórdão, o TST confirmou ser indevida indenização por danos morais e materiais à professora por uso indevido da imagem e violação dos direitos autorais relativos às obras literárias (apostilas e materiais de sala) e audiovisuais (vídeo aulas) por ela produzidos, após a extinção do contrato de emprego.
A decisão levou em consideração o contrato de “edição, cessão de direitos autorais e uso de imagem” que cedia à instituição de ensino o uso dos direitos autorais e da imagem para gravação das vídeo aulas, conforme autoriza a Lei nº. 9.610/98 em seus artigos 49, incisos II e VI e 50, caput, inclusive porque o contrato foi firmado com trabalhador intelectual.
Diante da previsão expressa no contrato de que a cessão do material didático e das vídeo aulas produzidas pela professora era definitiva, mediante contraprestação já paga à mesma, não há que se falar em indenização de qualquer natureza, entendeu o TST.
A decisão é da 2ª Turma, que já possuía precedentes no assunto – vide acórdão proferido no AIRR-1246000-84.2009.5.09.0028, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 27/10/2017 – e demonstra a importância no instrumento contratual que precede a contratação e a adequação de todos os seus termos ao uso que se pretende dar ao material didático.

IMOBILIÁRIO: DESISTÊNCIA DE COMPRADOR MOTIVADA POR NÃO OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO POSSIBILITA APLICAÇÃO DE CLÁUSULA DE RETENÇÃO DE 50% DO VALOR PAGO.

A 4ª Vara Cível de Tatuapé/SP reconheceu a legitimidade e aplicação de cláusula de retenção de 50% da quantia paga em favor da incorporadora, em virtude de os compradores desistirem da aquisição do imóvel, motivados pela não obtenção de financiamento bancário.
A decisão tem como fundamento legal dispositivos da recente Lei do Distrato (Lei nº 13.786/2018), que tem como maiores destaques a definição de penalidade para os casos de atrasos de entrega das obras, o estabelecimento de parâmetros para o exercício do direito de arrependimento e a estipulação das diretrizes para a desistência de negócios.
A Lei nº 13.786/2018, sancionada no momento de crise do segmento da construção civil, tem o propósito de equacionar negócios imobiliários e impedir tanto que consumidores sejam lesados, quanto que as incorporadoras se vejam em declínio financeiro, funcionando como ferramenta do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos.
A retenção de 50% estabelecida contratualmente no caso destacado encontra amparo legal no artigo 67-A, que estabelece que a incorporadora poderá penalizar o comprador em até 50% da quantia paga, quando a incorporação estiver submetida ao regime do patrimônio de afetação, formato em que o valor pago pelos compradores é destinado à construção do próprio empreendimento.

ELEVADO VALOR DE IMÓVEL NÃO AFASTA A IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA.

A 2ª Turma do TST reformou acórdão do TRT 1ª Região que afastou a impenhorabilidade do bem de família de imóvel com elevado valor.
No caso analisado, embora o Tribunal Regional tenha registrado que os documentos anexados, assim como a certidão do Sr. Oficial de Justiça, comprovavam que o imóvel penhorado servia de residência à família do espólio executado, entendeu-se que não havia vedação legal que impedisse a venda do bem diretamente pelo proprietários, uma vez que o imóvel constrito possuía valor de mercado mais de 270 vezes superior ao crédito exequendo e o montante apurado poderia subsidiar a aquisição de outro bem igualmente protegido, que melhor atendesse ao direito fundamental de moradia dos proprietários.
Lado outro, entenderam os Ministros da 2ª Turma que, ao manter a subsistência da penhora, aquela Corte proferiu decisão em afronta ao artigo 6º da Constituição Federal, pois o fato de tratar-se de imóvel de alto valor não retira a proteção legal que determina a impenhorabilidade do bem de família
De acordo com o TST, o bem de família, tal como prevê a Lei n° 8.009/1990, é um instituto de caráter social, cuja finalidade é assegurar a integridade dos bens indispensáveis à normal sobrevivência. Desta forma, o elevado valor o imóvel não se trata de exceção ao procedimento de constrição, não havendo que se falar em relativização do instituto da impenhorabilidade do bem de família em nome da natureza alimentícia do crédito trabalhista, por ausência de previsão legal quanto a esta solução, ressaltando, ainda, que a moradia constitui direito social fundamental consagrado no art. 6º da CF.

PRIVACIDADE E PROTEÇÃO DE DADOS: PROCON/RS AUTUA LEROY MERLIN, PRIVÁLIA, JAMES E CENTAURO POR INFRAÇÃO À LGPD.

A Superintendência para Orientação e Defesa do Consumidor (Procon/MS) autuou as empresas Leroy Merlin, Privália, James e Centauro por descumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (“LGPD”).
Os fiscais do Procon/MS realizaram fiscalização em diversos sites e aplicativos de vendas, onde constataram a adoção de termos de uso abusivos, irregularidades nas políticas de privacidade como a falta de detalhamento e informações quanto ao tratamento de dados pessoais, previsão de inclusão automática do consumidor em programas de fidelidade, falta de exatidão e clareza quanto a ocorrência de compartilhamento de dados dos titulares com terceiros, bem como declararam excessiva a coleta de dados biométricos em razão da manutenção da segurança do usuário. Também foram encontradas informações inverídicas sobre a própria LGPD nos termos da política de privacidade de uma das empresas citadas.
Após a autuação, as empresas têm um prazo de 20 (vinte) dias para se manifestarem; decorrido esse período, o caso é encaminhado para decisão administrativa, havendo possibilidade de gerar multa por infração.
As sanções da LGPD entraram em vigor em 1° de agosto de 2021 e não impedem a aplicação de sanções civis ou penais, penalidades definidas pelo Código de Defesa do Consumidor, assim como, fiscalizações do Ministério Público e PROCON.

PRIVACIDADE E PROTEÇÃO DE DADOS: A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DA PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS.

Publicada no Diário Oficial da União (11/02), a Emenda Constitucional n° 115/2022 torna a proteção de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, um direito fundamental assegurado na Constituição Brasileira. A medida é um marco civilizatório, que fortalece a arquitetura legislativa da proteção de dados no país e tem por objetivo evidenciar a intenção de devolver ao titular de dados a autonomia sobre os seus dados pessoais.
Com a mudança, a proteção de dados pessoais passa a elencar o rol de direitos fundamentais do cidadão, assim como saúde, liberdade e educação. Na prática, a nova garantia constitucional dará maior robustez aos argumentos jurídicos utilizados no contencioso em defesa dos titulares de dados pessoais.
O assunto passa a ter maior relevância para o cenário jurídico, tornando a sua regulação e a fiscalização ainda mais forte, especialmente por parte da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Além disso, a aprovação da emenda se faz oportuna uma vez que, ao se reconhecer a proteção dos dados pessoais como direito fundamental, é garantida uma via de acesso mais clara ao Supremo Tribunal Federal (STF) em casos de violação, para análise e julgamento.
Por fim, a União passa a ter competência privativa para legislar sobre o assunto, evitando, assim, dispersão e falta de uniformidade sobre o tema, proporcionando maior segurança jurídica.

Por  Aline Melo, Camila Lucena, Edson Gomes, Flávia Meireles, Juliana Abreu, Larissa Pinheiro e Luan Alves.

 

 

 


MENOS RISCOS, MENOS BUROCRACIA E MAIS EFICIÊNCIA

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