Em uma decisão unânime, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou o cultivo da planta Cannabis sativa com baixo teor de tetrahidrocanabinol (THC), desde que exclusivamente para fins medicinais e industriais farmacêuticos. O julgamento realizado em 13 de novembro representa um marco no acesso a medicamentos à base de canabidiol (CBD) no Brasil e traz novas perspectivas para o setor de saúde e para a indústria farmacêutica nacional.
A permissão é restrita a empresas e prevê o cultivo da variedade conhecida como cânhamo industrial, que possui baixa concentração de THC, o princípio psicoativo da planta, mas é rica em canabidiol, substância usada no tratamento de doenças como câncer, epilepsia, Alzheimer e Mal de Parkinson. A decisão determina que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a União regulamentem o cultivo em um prazo de seis meses, estabelecendo critérios para a produção e controle.
A relatora do caso, ministra Regina Helena Costa, destacou que a decisão não se confunde com debates sobre descriminalização ou uso recreativo da maconha. Segundo ela, é fundamental separar o cânhamo industrial das variedades utilizadas como entorpecentes. A ministra também ressaltou que a ausência de regulamentação até o momento impõe barreiras ao exercício do direito à saúde, ao dificultar o acesso a medicamentos com base em canabidiol.
No voto que guiou o julgamento, Regina Helena Costa afirmou que a demora na regulação prejudica tanto os pacientes quanto o desenvolvimento da indústria nacional. Ela destacou que a dependência da importação de insumos encarece os medicamentos, limitando o acesso de pessoas com menor poder aquisitivo. Além disso, a falta de normas específicas inviabiliza a ampliação de terapias de baixo custo e restringe o potencial econômico do setor, que poderia gerar empregos e fomentar pesquisas científicas no país.
A advogada e sócia da Abreu, Barbosa e Viveiros (ABV) Advogados, Juliana Abreu, destaca que “a decisão beneficiará não apenas pacientes, que terão acesso mais rápido e barato aos medicamentos derivados da cannabis, como também ao Judiciário e União, com redução de demandas, e às empresas que se propuserem à pesquisa, cultivo e desenvolvimento de medicamentos no Brasil.”
“A indústria global da cannabis legal já alcançou previsões de movimentar US$ 45 bilhões em vendas até 2027, certamente esses números serão impactados com o precedente favorável no Brasil”, acrescenta Juliana Abreu.
A decisão do STJ também possui caráter vinculante, o que significa que juízes e tribunais em todo o Brasil deverão aplicar o entendimento da Corte. Apesar de caber recurso, o julgamento representa um avanço significativo na ampliação do acesso à saúde e no desenvolvimento do setor farmacêutico nacional.
Agora, o desafio recai sobre a Anvisa e a União, que têm até abril de 2024 para apresentar uma regulamentação clara e eficiente para o cultivo e a produção de medicamentos à base de cânhamo. Enquanto isso, a expectativa é de que o mercado e a sociedade avancem na direção de um acesso mais democrático e econômico a terapias inovadoras.